quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Choveu na Beira do Mundo

Na noite de terça-feira, dia 18 de setembro, completavam-se incessantes cinco dias de chuva em Porto Alegre. Em pleno vapor o Porto Alegre em Cena cumpria seu cronograma, debaixo de chuva, embarcados em botes se assim fosse necessário. Estamira – beira do mundo e sua plateia lotada estavam à beira do mundo no Teatro de Câmara Túlio Piva. O público enfeitiçado por conseguir ver de perto o que afasta de si diariamente. A loucura como espelho da realidade. A moradora do lixão contava sobre o passado com o avô, seus casamentos e o filho invisível, que, de todos, era o que mais a ajudava. Em meio a risadas nervosas, e, até mesmo, com um cadim de culpa, uma goteira insistente passa a ser um fio de água. A plateia alonga o pescoço de forma a tentar ouvir melhor. Estamira bate seu cajado no chão dizendo que faz parte da vida de todos. O barulho aumenta. Alguém da produção se aproxima do palco. Dani Barros, atriz: “Parece que o teatro está alagando. (...) Podemos parar aqui ou continuar.”. Sem vacilar o público pede para que o espetáculo continue, afinal de contas querem saber por que Estamira sai da invisibilidade de um lixão para contar sua história no palco. Quando aquele chapéu no canto do banco será usado? A máscara de macaco volta? As vozes ouvidas pela personagem serão ouvidas por todos? Até que ponto ou a partir de qual deles eu vou me identificar com uma moradora de um lixão? Essas perguntas não foram respondidas nessa noite. A decisão unânime de prosseguir com o espetáculo foi rompida juntamente com o teto do teatro e a água cercou a beira do mundo. Estamira não teve fim, arrisco a dizer que chegava ao seu auge, mesmo assim, aplaudido três vezes. A entrega do ator. Os olhos atentos da plateia. O esforço e competência da produção do festival. E o espetáculo não se realiza em sua plenitude por falta de manutenção no Teatro de Câmara. Se for possível pedir algo, peço um olhar mais carinhoso para os teatros. Não se nota o esforço geral para que se tenha acesso à cultura? Para que se consiga assistir uma peça de outro estado? Conhecer novas linguagens? Não se quer enxergar a cultura na sua magnitude, na sua possibilidade de informar, unir, compartilhar. Teatro não é distração. É trabalho, trabalho com prazer, talvez isso seja um pouco difícil de entender. Quem vai olhar por isso?

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