sexta-feira, 30 de novembro de 2012

Asfalto de espetáculo


Um engarrafamento interrompeu a o trajeto do ônibus de viagem. As teorias ja começaram a se levantar, os passageiros cogitaram um assalto, alguém disse que era um acidente. E a célebre frase surgiu:
- Melhor que tenha sido um acidente do que um um assalto.
Claro, nada mais óbvio do que preferir que a pimenta arda no dos outros. Ah! E andem logo com esses corpos aí na frente pra gente poder seguir viagem. Uma Saveiro parece ter vindo na contramão e entrou debaixo de uma carreta, na pick up ninguém sobreviveu.
Na sociedade do espetáculo a morte é algo comum pra ser fotografado, filmado... e não foi surpresa que um passageiro do ônibus entrasse com gravações do seu ipad do momento em que tiraram os corpos da Saveiro. Os comentários não amenizam  a situação.

- Mas me falaram que tavam inteiros...

- Pois é, olha ali um pedaço caído pra fora!
Claro, só nos falta o canibalismo como alimento diário, porque de resto, comemos crenças e a nossa terra sem remorso algum. Talvez eu esteja sendo careta demais, talvez eu devesse aprender mais com os mexicanos a festejar a morte. Mas sim, festejar, não fazer uma sessão de cinema pós mortem com os companheiros de viagem.
- Bom, mas disseram que liberam a pista em 20 minutos.
Foi levantada a possibilidade de desviar e seguir por uma estrada de terra caso a liberação da via
demorasse.
- Ah! mas lá tem estrada de chão e a aldeia indígena... Deus me livre!
CLARO, SÃO ELES OS CANIBAIS!!!

Todos ficam parados na pista, o motorista vem informar que a Saveiro era roubada e que os amigos do condutor e do passageiros vieram ver o que aconteceu. Estavam com os olhos inchados e com uma cachaça na mão, entao ufa! Está tudo justificado e eles mereceram, a gente nem tava se importando, mas agora que são bandidos, menos ainda!
O pensamento é treinado, direcionado, a sociedade é dividida entre os bons e maus, assim fica mais fácil julgar quem é merecedor do paraíso e quem vai arder no fogo do inferno. Eu acredito em uma sociedade mais maleável, que transcenda as divisões feitas pela política e pela igreja, mas ainda acho que a estrada é longa
Penso que esse relato pode sinalizar um comportamento que muitos pensam estar sendo limado. Edgar Morin, diz que nós estamos na idade do ferro da era planetária. Estamos numa sociedade ainda infantil, a autodestruiçao nos agrada e a puberdade dessa era ainda tarda a chegar.

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